A Casa Quatro: O Imum Coeli, Nossas Raízes Subterrâneas e o Abraço Lunar
No estudo da astrologia, avançar para além dos signos e planetas e mergulhar nas Casas Astrais é um verdadeiro rito de passagem. Elas são os doze palcos onde a ação cósmica se desenrola em nossa vida terrena. Entre elas, a Casa Quatro, governada pelo grau mais baixo do céu, o Imum Coeli (IC), detém um poder silencioso e profundo, sendo o verdadeiro alicerce de quem somos. Para nós, brasileiros, acostumados a valorizar a família e o lar, entender essa casa é fundamental para desvendar as camadas mais profundas do nosso ser.
Sua importância não é nova. Desde os primórdios da astrologia mesopotâmica, os quadrantes do céu já indicavam áreas de visibilidade e ocultamento. Na tradição helenística, astrólogos como Dorotheus e Valens a codificaram como o hypogeion topos — o setor subterrâneo do Mapa. Pense nela como o porão da nossa casa astral: o lugar das fundações, das origens, da ancestralidade e, curiosamente, do fim das coisas.
O Ângulo da Terra: Fundação e Ocultamento
Ptolomeu a chamou de "ângulo subterrâneo", e Firmicus Maternus, de morada das coisas ocultas e dos pais. Ao longo da Idade Média, essa simbologia se consolidou. Para astrólogos como William Lilly, ela é o "ângulo da Terra". Isso significa que a Casa Quatro representa tudo aquilo que está abaixo do horizonte visível: nosso ninho, nosso legado familiar, nosso patrimônio (material e emocional) e o solo fundamental de nossa existência.
Cosmologicamente, o IC marca o ponto mais baixo do céu, correspondendo à direção do Nadir — o ponto diretamente abaixo de nós. É a meia-noite do mapa, a base sobre a qual toda a estrutura celeste se apoia.
A Regência Lunar: O Útero e o Túmulo
A Casa Quatro é tradicionalmente regida por um signo de Água Cardinal (Câncer), que inaugura o movimento do "eu" para o aconchego do "nós". Mas o mais fascinante é sua associação primária com a Lua, a luminária da noite. A Lua, em sua essência noturna, torna este setor úmido, frio e profundamente receptivo.
Para os antigos, a Lua era a guardiã dos ciclos, a reguladora da fertilidade e a mediadora entre o mundo incorruptível dos céus e a esfera geradora e decadente da Terra. Na Casa Quatro, essa energia lunar se manifesta como o útero (o começo) e o túmulo (o retorno). Planetas localizados aqui não costumam gritar sua função; seu poder é subterrâneo, agindo nas raízes do nosso caráter, revelando o que mantemos em segredo, mas que é essencial para a nossa estabilidade.
Lendo a Base: Uma Questão de Profundidade
Quando o astrólogo se depara com uma Casa Quatro ou seu regente muito ativados no mapa (seja por planetas fortes ali, ou por muitos aspectos), a interpretação exige sensibilidade. Devemos privilegiar a tradição da ancestralidade e do patrimônio? Ou devemos focar na ressonância da alma que "desce" para a matéria, a base lunar da encarnação?
No contexto brasileiro, onde a memória familiar e a busca por um lugar seguro são tão presentes, a melhor abordagem é a integração. A Casa Quatro nos convida a olhar para o eixo de origem e retorno. Ela pergunta: De onde eu vim? Que memórias emocionais carrego? E, mais importante: Que solo estou cultivando para o meu futuro?
Entender a Casa Quatro é entender que a verdadeira força não está apenas no que mostramos ao mundo, mas na solidez da fundação que construímos em nosso mundo interior e familiar. É o nosso porto seguro, o espelho das nossas raízes mais profundas.